Aspectos da pandemia

Aspectos da pandemia

A humanidade seguia seu curso num rumo ascendente aparentemente inalterável. O avanço, o progresso da ciência, a implacável jornada rumo à conquista.

Mas de repente um vírus, algo tão pequeno, tão invisível, coloca todo o mundo civilizado de joelhos. De repente um abraço se tornou um risco, um beijo, sinal de perigo. As primeiras mortes estamparam os jornais do mundo inteiro, o medo começou a surgir tudo parece incerto agora e as portas começam a fechar.

Já não se vê com exatidão o rosto das pessoas, seja pela cobertura das máscaras, ou pelo aumento exponencial do número de mortos. Quantos estão contaminados? Quantos morreram?

As portas se fecham mais rápido agora.

Pela primeira vez em séculos, precisamos pensar se sair de casa vale à pena, pela primeira vez em dezenas de anos, o capitalismo sente a incerteza transfigurada nos gráficos das bolsas de valores.

E as cifras caem na mesma velocidade em que os prejuízos são contabilizados. E o ser humano começa a precisar tomar decisões que antes eram tomas por outras pessoas ou em razão das próprias circunstâncias. E agora? Devo sair pra trabalhar ou ficar em casa?

Você precisa trabalhar, têm contas a pagar, bocas pra alimentar. Mas isso significa colocar a minha vida e a dos seus próximos em perigo. Salve a economia? Sem ela não há qualidade de vida. Salvar vidas? Sem elas pra quem a economia vai proporcionar bem estar.

 Mas enquanto eles se decidem os números aumentam, as unidades viram dezenas, e as dezenas viram centenas, milhares a caminho da morte.

A culpa é da esquerda, a culpa é da direita. Eles gritam nas ruas, tomas avenidas numa tentativa tão inerente ao ser humano de encontrar culpados e punir. É irracional, mas estão todos brigando em multidões pra decidir de quem é a culpa e qual a melhor maneira de lutar; lutar numa guerra em que os dois lados só venceriam se conseguissem se unir.

Não se fala em outra coisa nos jornais, não há outras coisas acontecendo? Noticias ruins vendem mais? Mas se tirarem o foco do covid  a população seria capaz de não se manter alienada e dar a devida importância a essa luta contra a pandemia?

Defendendo seus políticos, líderes, gurus enquanto estes, no alto de seus pedestais, se preocupam apenas em manter seu poder e suas cifras, que despencam como frutas podres, seus leitos em hospitais particulares já estão garantidos, seus médicos atendem a domicílio. Enquanto isso os que por eles brigam, se expõem, se destroem, rezam para que consigam uma vaga nos corredores lotados dos hospitais públicos.

“É um vírus eclético” disseram eles, “estamos todos no mesmo barco, ricos, pobres, pretos, brancos” alegaram, mas é apenas uma falácia, é apenas uma estratégia para se conformar com a imagem escancarada da desigualdade que essa pandemia acentuou.

A corrida pela cura parece tão lenta e as centenas se tornaram milhares e os milhares agora são milhões. Cada rotina modificada no seu mais simplório detalhe.

As fábricas estão silenciando as máquinas, a baixa nas carteiras de trabalho demonstram a insatisfação dos números, as cifras reclamam. Pela primeira vez desde a Revolução Industrial, as máquinas estão parando de vez, as crises econômicas anteriores parecem ecoar no presente, um fantasma triste e sádico.

Algumas ruas em silencio, o movimento diminui e a natureza tenta resgatar o espaço que lhe foi tomada há muito tempo. Não é curioso e que apenas a espécie humana despenca aos milhares sob o jugo dessa pandemia? O resto do reino animal parece não ter sido afetado, como se a natureza se vingasse pelos milhares de anos de destruição e crescimento desenfreado de sua mais ‘inteligente’ criação.

As escolas fecharam as portas, as crianças, o futuro, agora está em casa. Céus, como é difícil educá-las em casa, agora dá pra entender a importância e o fardo dos professores, a nobre e desvalorizada profissão de ensinar.

As equipes médicas se desdobram, mantendo-se firmes num trabalho quase invisível de lutar contra a morte, dos pacientes e deles mesmos.

Agora, ainda que não por querer, muitos experimentam a sensação de estar sozinho. De repente ouvir os próprios pensamentos parece ser tão ensurdecedor, um silencio doloroso que expõe a verdade nua e crua de se estar consigo mesmo. Você é uma boa companhia para si mesmo? Consegue passar um dia inteiro tendo apenas você e seus próprios pensamentos?

Mas sabe? Ainda que tantas dificuldades venham acontecendo, há coisas boas no mundo e esta faceta também é importante.

As máscaras tamparam os rostos, mas nos fizeram olhar mais nos olhos uns dos outros, prestar mais atenção no que nos é dito.

As fábricas paradas, o comércio tradicional afetado fez aflorar, como sempre a criatividade das pessoas, alguns, ainda que não todos, tiveram aquele empurrãozinho que faltava para criar coragem e finalmente mudar de carreira, outros se puseram a pensar na importância de se sentir bem trabalhando no que gosta.

O céu está mais limpo e as estrelas mais visíveis do que antes, há propósito as pessoas começaram de mover olhar da tela do celular para as coisas que acontecem ao seu redor. Já olhou pras estrelas hoje? Já viu os primeiros raios de sol tocando o céu em tons de dourado inigualáveis? Já viu ele se pondo deixando um rastro escarlate? Agora da tempo

Que saudade dos abraços descontraídos, dos sorrisos escancarados, das ruas livres pra se ir e vir sem medo de que algo invisível lhe roube a vida. Um eu te amo agora parece ter um peso diferente, e a companhia das pessoas que amamos tem uma importância muito maior do que antes.

E o que nos resta, como em tantos outros momentos sombrios na história da humanidade, é a esperança, pois sempre há o brilho do sol após as mais terríveis tempestades, sempre há a possibilidade de um amanhã melhor que o hoje. Resta-nos a esperança de que esses pequenos detalhes se mantenham importantes quando tudo isso passar, porque vai passar, um dia, seja lá qual for o preço que nos custar, tudo isso vai passar e teremos a chance de recomeçar, com mais maturidade, mais fortalecidos e, tomara, mais unidos.

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